Ensaios

Abaixo Spielberg e Lucas! Abaixo o cinema família!

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Bem intencionados, habilidosos, mas reacionários

Acho que grande parte da minha geração teve seu primeiro contato com ficção científica através dos filmes de Lucas e Spielberg. São espetáculos grandiosos e graficamente belos com heróis jovens ou mesmo infantis que em nada lembram os aterrorizantes filmes B dos anos 50 ou as fantasias eróticas, apocalípticas, sociais e/ou conceituais dos anos 60. São filmes limpos, inteligíveis, extremamente cativantes e aparentemente sem ideologia. Aparentemente.

Por trás da maestria narrativa e técnica, eles trazem sempre uma mensagem de resgate da família. Luke, Leia e Anakin. ET e seu povo. THX 138 e LUH 3417. Richard Dreyfuss, o menino e o povo do espaço do qual, sem saber, faziam parte. Todos esses heróis viviam em cenários mágicos e surpreendentes mas sua única preocupação era mostrar uns aos outros que o mais importante era que a família voltasse a se reunir. Por trás de toda essa variedade de construções de mundo se escondia um monotema que se repete até hoje: a família precisa ser reunida.

Também, o que podia se esperar de dois baby boomers, filhos de divórcios, que não conseguiram se encaixar nas comunidades de amor livre nos anos 60? Para eles, esse novo mundo alienígena do qual não faziam parte não lhes suscitava novos desafios ou experiências, apenas nostalgia de algo que nunca tiveram: uma família unida e nuclear.

Podemos imaginar que essa preocupação com a busca pela família pode ser reflexo de uma questão social: o fim das comunidades em prol de um sistema totalitário, invisível e sem amor; contudo acho essa uma visão muito reducionista. Se fosse uma fantasia retrô, as comunidades seriam afetadas e transformadas, o que não acontece. Já percebeu que Lucas nunca se preocupou em contar o que acontece com o universo Star Wars depois da reunião familiar? O que lhes preocupa é que, seja o mundo que for, a família possa se abraçar e proclamar o seu amor. Não são fantasias de crescimento, são fantasias de retorno ao útero.

Acho que desde de Lucas e Spielberg, excetuando algumas experiências cyberpunk de Verhoeven nos anos 80/90, não tivemos outros cineastas de ficção científica realmente significativos. Para dizer a verdade, eles acabaram se tornando o padrão que até hoje, com menor ou maior qualidade, é repetido. Abrams, Whedon, Nolan. Todos competentes aprendizes, lamentando de diferentes maneiras pelas famílias perdidas. As técnicas narrativas e os efeitos visuais melhoram, o tema permanece o mesmo. Quem aqui não perdeu 6 anos esperando algo em Lost para descobrir que era apenas uma história careta de reunião familiar?

Para o bem do nosso meio social, seria necessário retomar a função de transformação da ficção científica. E a minha esperança está, pasmem, na literatura Young Adult. Ao contrário da falta de profundidade dos plots repetidos mascarados pela quantidade de absurda de CGI, alguns dos bons livros dessa safra contam histórias de amadurecimento e de libertação da família. E é isso que a nossa sociedade precisa: gerar mais autonomia em seus participantes. Só assim nos libertaremos dos inchados e venenosos seios do consumismo e da busca desesperada pelo status. O que espero do futuro e da ficção científica que minha filha vai encontrar é um grupo de pessoas que, como Katniss Everdeen, de The Hunger Games, e W1n5t0n, de Little Brother, se voluntarie em prol da família e da comunidade para mudar a sociedade ao invés de apenas querer se refugiar dos problemas da sociedade nesse abraço familiar.

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Vai, Katniss, ser gauche na vida

A minha esperança está nessa ficção científica. Ah, e, não posso esquecer, no Darren Aronofsky também. 😉

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