Ficção

Nada de novo

No grupo de familiares e amigos, foi o último a se desfazer do celular. Finalmente, depois de 18 meses de inatividade, chegou à conclusão que não fazia mais sentido carregar aquele pedaço de plástico e metal prum lado e pro outro.

Como uma criança se desfazendo da chupeta, jogou o aparelho sem uso numa daquelas latas de lixo para eletrônicos que foram instaladas em todas as esquinas, e, livre daquele peso, respirou fundo. Tudo parecia diferente.

Um silêncio feito de pequenos e indistintos sons penetrou seus ouvidos e lhe deu a impressão que, pela primeira vez, a pressão externa e interna estavam equilibradas. Olhou pro céu azul e o sol lhe cegou por um pequeno momento. “Pra onde ir?”, se perguntou tomado pelo calor e pelo clarão aconchegante dos raios solares. Não tinha resposta, nem a quem perguntar. Resolveu caminhar sem rumo.

No caminho, reencontrou paixões ancestrais, vizinhos queridos e amigos de infância. Se deixou levar pela fome, e comeu, em lanchonetes perdidas, antigas delícias que o lembravam da sua história. Parou em sebos e folheou revistas e livros que sabia de cor, mas tinha esquecido. E enfim chegou na praça.

Calados, sozinhos ou acompanhados, os moradores das redondezas tomavam cerveja e sol, enquanto observavam as crianças correrem e subirem em brinquedos exercitando um silêncio esquecido, mas necessário. Foi até o pipoqueiro, comprou a sua cerveja e se sentou num banco ao lado de um desconhecido. Se cumprimentaram com um silencioso e sincero balançar de cabeças. Tomou um gole generoso da sua garrafa, fechou os olhos sorrindo e jogou a cabeça para trás, para sentir o sol em toda a sua plenitude.

Não tinha nada pra contar. Enfim.

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