“The way does not lead between, but embraces. It is both cheerful play and cold horror.” — Carl Jung
Nas redes sociais e nas ruas, o consenso parece ser que 2014 foi um péssimo ano. Pessoalmente, não gosto de atribuir valor a construções ficcionais. Um ano não tem como ser bom ou ruim. O ano que vem, por exemplo, também não vai ser melhor nem pior. O que pode acontecer é calhar que a maioria dos fatos num dado período de tempo seja mais ou menos agradável. E só. Já o ano em si… ele não tem significado. A não ser aquele que lhe atribuímos.
Por mais que não goste de fazer isso, sou humano. Sim, podem acreditar. Pra piorar leio quadrinhos, ficção científica e fantasia regularmente; jogo RPG; e mantenho relações emocionais com seres ficcionais. Sim, sou um escravo emocional da ficção. Incluindo aquela que chamam de Vida. Exatamente como você. E que atire a primeira pedra quem nunca se emocionou lendo ou vendo um filme que ama. Portanto, nesse momento de retrospectiva forçada, começo a valorar o ano que passou numa tentativa fútil de prever o que ocorrerá em 2015. A minha conclusão? Para mim 2014 não foi bom nem ruim. 2014 foi um ano marcado por grandes momentos de medo e alívio.
Começou com a nascimento da Alícia em fevereiro. Momento feliz e inédito, mas antecedido por diversos medos. Serei um bom pai? Daremos conta de criar uma criança? E o parto, então? Até a Alicinha nascer, durante aquelas 30 horas de tensão contínua, todos os medos possíveis e imagináveis rondaram a minha mente. Uma enxurrada de emoções onde muitas vezes me via como passageiro da minha própria existência. Quando ela nasceu, foi como se algo há muito quebrado tivesse sido resolvido. O alívio e a felicidade, nem preciso dizer, foram enormes e se propagam até hoje.
Em maio, o chamado veio da minha ascendência: minha mãe infartou. Uma surpresa ruim no meio de uma madrugada de uma quinta feira. Muita correria e ansiedade. A sensação de não saber o que iria acontecer, como ela ficaria depois e como eu reagiria a todo esse novo cenário foram prato feito para os meus medos. Passei, com uma filha recém nascida, a antecipação de uma perda que felizmente não ocorreu. Quando a situação acalmou, foi como se, após segurar a respiração por quase uma semana, eu pudesse respirar fundo pela primeira vez. Cá entre nós estavam novamente o medo e o alívio.
Em julho, outra porrada: fui demitido. Pela primeira vez na minha vida. Apesar de ter uma certa reserva financeira, o clima econômico geral não inspirava muita tranquilidade. Some a isso ter uma filha pequena, estar morando longe da família e da maioria dos amigos, e as sensações de inadequação que uma demissão provoca. Presto!, medo, medo e mais medo. Felizmente, pude contar com uma rede de proteção que em pouco tempo me colocou de pé, de volta a um excelente grupo de amigos, num trabalho onde me sinto verdadeiramente valorizado como não me sentia há muito tempo. Um grande alívio após anos num emprego pouco recompensador criativa e emocionalmente.
O que pude aprender com esses ciclos de medo e alívio? Nada de muito novo. Que não devemos temer aquilo que poderá nos fazer feliz, nem aquilo que não pode nos fazer mal; que somos crias de nossos hábitos e que as perdas que teremos refletem nossa relação com esses costumes; e que não devemos adiar as oportunidades de nos livrar daquilo que nos faz mal, pois, eventualmente, sem aviso, algo irá nos libertar dessa prisão ou nos matar por nos acomodarmos.
Em resumo, aprendi que não adianta esperar nada de 2015, 2016 ou até 2237. Anos não são bons ou ruins. Nós somos. E o tempo que usarmos será tão bom ou ruim quanto o que fizermos dele.
Assim, não lhe desejo um feliz 2015. Desejo a mim e a você que façamos cada vez melhores escolhas com objetivos cada vez mais puros e belos. Desejo que desejemos menos e amemos mais o que temos. Desejo que tenhamos menos medo e mais confiança que o que plantamos estará sempre lá para nos ajudar. Desejo, enfim, que eu seja cada vez mais eu e que você seja cada vez mais você. Sem culpa ou temor.
E a todos que participaram comigo desse assustador e recompensador pedaço de vida que foi 2014, muito obrigado. Saiba que estaremos juntos nos anos que virão vivendo os sustos e as recompensas que fazem essa vida valer a pena.
Até 2015!