Agora que o anormal se tornou normal, me pergunto o que faremos quando as coisas, supostamente, voltarem ao normal. Quer dizer, o antigo normal.
Sem resposta, eu lembro do meu pai. Ex-combatente, voltou da 2a. Guerra, como muitos previam, maluco, ou, em inglês shell shocked. Maluco de guerra, pero no mucho. As doideiras, tirando a fixação com a 2a. Guerra, se manifestavam esporádica, pontual mas intensamente.
Era só ele entrar em um barco qualquer, incluindo a barca Rio-Niterói, que ele ficava paralisado. Olhar fixo, suando frio e tremendo. Vi isso acontecer só duas vezes, mas foi o suficiente para me traumatizar e me transmitir fenotipicamente a mesma fobia.
Mas não era um medo irracional. Era um medo explicado e psicanalisado. Era só ele saltar do barco pra justificar:
-Fui pra Itália no porão de um cargueiro que achávamos que ia ser torpedeado. Não foi, chegamos ilesos, mas sofri cada minuto daquela viagem.
Por sorte, ele voltou da Guerra de avião, com uma parada em Casablanca, onde adquiriu o seu vício em Coca-Cola que é um capítulo à parte.
Quando penso em como será a volta à dita vida normal lembro do meu pai e das sequelas que trouxe da Guerra. Quais sequelas traremos dessa guerra contra o CoVid-19?
Usaremos máscaras voluntariamente para tornar nossos rostos em fetiches? Preferiremos encontrar nossos amigos em curtas videconferências resumindo nossas interações em conversas desconexas e sem sentido em grupos de 20? Escolheremos comer em casa por questões de economia e para evitar a cada vez mais assustadora presença de outros humanos? Educaremos nossos filhos no lar e usaremos as escolas como espaços de interação social? Enfim, o mais importante, continuaremos a ensaboar latas de cerveja?