7 de setembro de 2021
9:57 AM
No bloco C do Edifício JK, de um apartamento não identificado, começa a tocar, num volume acima do esperado, o hino nacional. Dada a atual situação política, os demais condôminos ficam incomodados. Mas não fazem nada.
10:08 AM
Depois de 2 versões remix do hino nacional e de uma versão à capela do hino da bandeira, Matilde Rocha, professora de Yoga sexagenária, decide se manifestar:
– Desliga essa porra, filho da puta.
O DJ aumenta o volume.
10:16 AM
Num volume insuportável, o hino do exército entra no terceiro repeat e um coro se forma:
– Fora, Bolsonaro! Fora, Bolsonaro!
O DJ aumenta o volume novamente, mas, logo após o quarto repeat do hino, entra a propaganda do plano gratuito do Deezer. O som é desligado no meio do reclame digital, sob as risadas dos demais condôminos.
10:33 AM
Depois de um breve período de paz, o DJ Fascista volta a atacar, agora com uma playlist temática sobre o Brasil. Toca “Brasileiro com muito orgulho” do Timbalada e “Aquarela Brasileira”, na versão do Emílio Santiago. O restante do prédio faz até vista grossa. Quando Caetano Veloso começa a cantar “Aquarela do Brasil”, um engraçadinho do quinto andar grita:
– Vai pra Cuba, comunista!
10:52 AM
O DJ se irrita e retoma a playlist dos hinos. O povo, já sem paciência, rebate com gritos e até com uma Vuvuzela, resgatada da copa de 2014. Acuado o DJ contra-ataca gritando numa voz esganiçada quase infantil:
– A nossa bandeira jamais será vermelha!
Seu Luís, nonagenário, morador do 803 e calejado da ditadura do Estado Novo e do golpe militar de 1964, encerra a discussão:
– Ô, Mariozinho, para com essa merda de bolsonarista, menino, senão eu vou falar com o síndico e com o seu pai. Ah, e já que tá nas carrapetas, vê se toca uma do Raul.
Sob vaias e risos ensurdecedores, Mariozinho desliga o som e vai pro quarto reclamar no twitter da censura e da falta de liberdade de expressão.
11:26 AM
Alguém coloca “Apesar de Você” alto para todo mundo ouvir. Mariozinho continua de castigo auto imposto. Enquanto isso, as instituições lançam mais uma nota pedindo a paz entre os poderes e respeito à constituição. Em Brasília tudo continua igual. Até quando?