Even the greatest stars
Discover themselves in the looking glass
Você vai à Livraria sem saber o que procura. Você vai à Livraria como quem precisa se encontrar.
Na vitrine, um funcionário, bem intencionado, mas esperto demais para o seu próprio bem, montou uma seleção de livros amarelos. Sim, apenas livros com capas amarelas, totalmente amarelas. Naquele deserto de nada, você tenta identificar quais são os títulos que queriam destacar, mas, frente à afrontosa monocromia, desiste. Talvez tenha mais sorte dentro da loja. Você entra.
A disposição do acervo, lamenta, não é das mais convidativas. Na entrada você tem 3 pares de mesas: uma para as novidades, outra para as promoções; uma para os Young Adults, outra para as biografias; enfim, uma para os religiosos; outra para os autoajuda. Do imediatismo às súplicas de salvação, passando pelo narcisismo, tudo parece a mesma coisa, tudo parece igual.
Nesse mar de informação que parece nada ter a dizer, você luta para se encontrar; você luta para encontrar o autor, ou a obra, que lhe represente, que se identifique com você. Como numa casa de espelhos, você procura nas distorções das capas, aquela que mais lembre a pessoa que você quer ser. Mais do que encontrar uma leitura, o que você realmente quer é se apaixonar.
Você quer, através da capa, a isca, a armadilha, que irá lhe atrair e lhe aprisionar, descobrir a pista que buscava sobre o texto que irá lhe transformar. Mas não parece fácil. Textos blocados sobre cores fortes parecem funcionar, mas quando todas as capas à sua volta usam a mesma estratégia, é difícil se destacar. Uma ilustração pesca a sua atenção para logo você vê-la repetida em outra obra com um tema totalmente diferente. O que, afinal de contas, elas querem lhe dizer sobre o que irá encontrar dentro do que as capas escondem?
No fundo da loja, boxes comemorativos se amontoam em segredo, e estantes atulham os títulos de menos destaque, mas não menos importantes, deixando apenas as finas silhuetas das lombadas para lhe seduzir. Pode parecer pouco, mas às vezes é suficiente. E, assim, numa resga de capa, você encontra a paixão de ocasião à qual irá se entregar.
Com o livro em mãos, você admira as cores fortes da capa, e a ilustração com pegada psicodélica. Enquanto decide se irá levá-lo ou não, lembra de já ter uma edição do mesmo livro mas com outro design. Um pocket book com uma imagem pouco atraente e cores confusas que pouco lhe atraía a leitura, a qual eventualmente abandonou, mais pelo difícil texto em português lusitano do que pela capa sem graça.
Só de segurar essa nova edição de um livro que já tem, você sabe que de que dessa vez a leitura será muito melhor. Afinal os livros não tem capa. As capas são uma parte do livro, assim como o texto e, mais do que simples atração de compra, elas também são um estímulo à leitura e ao diálogo com as ideias do autor.
Sim, não há mais dúvidas, esse é o livro que irá levar. A capa lhe convenceu.
Na fila do caixa, enquanto observa jovens carregando boxes de trilogias de capa dura com óbvias atrações pseudo góticas que nunca lerão, lembra que, apesar de poder ser discutido, sim, gosto é uma questão de geração, idade, época e formação. Então, tudo o que achou feio e desagradável, tanto nas capas como na disposição dos livros, para alguém, pode ter sido bom, ou, pelo menos, não tão ruim.
Compra feita, você encontra sua família na frente da livraria e, enquanto passam pela vitrine, você dá a sua opinião:
– Que vitrine horrível, não?
A sua família se surpreende e tem algo a dizer:
– Que Nada! Todo esse amarelo? Nós A-DO-RA-MOS…
Você respira fundo, lembra que gosto até se discute, mas tem coisas que não valem o mal estar que vão gerar. E, para exercitar mais uma vez o seu insuperável bom gosto, assim como todos consideram os seus, olha com carinho para a bela capa que na próxima semana irá lhe acompanhar.
Assim, você, já não tão jovem quanto antes, deixa a Casa de Espelhos para, em breve, retornar. É sempre um prazer se (re)apaixonar.
The young man stepped into the hall of mirrors
Where he discovered a reflection of himself (…)Sometimes he saw his real face
And sometimes a stranger at his place (…)He fell in love with the image of himself
And suddenly the picture was distorted (…)He made up the person he wanted to be
And changed into a new personalityEven the greatest stars
Change themselves in the looking glass
Even the greatest stars
Change themselves in the looking glass