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O Hercúleo trabalho de James Gunn

Há um antigo ditado budista que ainda causa muita controvérsia e discussão: “Se encontrares Buda na estrada, mate-o”.

Há muitas interpretações para esse koan: se você encontrar alguém que se diz Buda ou tenta parecer Buda, tenha certeza, ele não é o Buda e, por isso, deve morrer; ou, caso, por um milagre, seja realmente o Buda, você deve matá-lo, pois o que interessa não é a sua existência física, mas a sua existência enquanto espírito ou ideia; ou, numa visão moderna e jocosa, se você encontrar o Buda por aí, provavelmente ele deve ser um zumbi e, portanto, para evitar que a infecção dos mortos vivos se espalhe, sim, é melhor matá-lo.

Ontem, assisti ao James Gunn encontrar o Super-Homem na estrada e matá-lo belamente.

Não é de hoje e nem surpresa discutir o gênero de super-heróis como uma espécie de mitologia moderna. Do trabalho de Joseph Campbell com George Lucas na criação de Star Wars ao livro e documentário de Grant Morrison sobre os super-heróis como os deuses modernos, essas ideias já se tornaram senso comum. Porém, estranhamente, toda vez que se lança uma obra baseada nos super-heróis dos quadrinhos há uma grita. Os fundamentalistas decenautas ou os fanáticos marvetes fazem longas discussões sobre os méritos dessas obras derivativas, tratando desde a qualidade narrativa e técnica, até uma suposta fidedignidade aos conceitos originais dos seus santos padroeiros, quer dizer, seus super-heróis preferidos.

Enquanto assistia James Gunn fazer gato e sapato, com muito amor e carinho, do último filho de Krypton, fiquei pensando por que todo esse bafafá não se dá quando as sucessivas reinterpretações dos personagens ocorrem na sua mídia de origem, nos quadrinhos.

Por acaso, estou lendo A Obra de Arte na era de sua Reprodutibilidade Técnica do Walter Benjamin, onde, provocado especialmente pela fotografia e pelo cinema, ele discute a dessacralização da arte. Ele argumenta que no momento que a obra de arte passa a ser facilmente reprodutível ela se torna ao mesmo tempo algo do plano material, perdendo a sua aura divina, e se coloca, enquanto produto, objeto da ideologia capitalista, disponível e ansiosa pela crítica do público, o que seria inimaginável em tempos anteriores.

Antigamente, o encontro com a arte, assim como o encontro com o divino, era completamente particular e fenomenológico, como uma experiência religiosa, não passível de análise racional, crítica, ou sequer compartilhamento. A arte, enquanto experiência, existia como num religare religioso, para unir o humano ao transcendente que fora trazido à terra por autoras e autores, que só serviam como receptáculos desse poder do além.

Esse foi o tempo dos oradores e contadores de histórias, da arquitetura ligada aos templos, e do teatro como parte dos rituais religiosos. A arte, enquanto manifestação mezzo humana, mezzo divina, era aberta ao público como uma oportunidade de acessar uma verdade, ainda misteriosa, mas tornada, se não compreensível, apreensível pelos sentidos, pela nossa cognição e pelas nossas emoções.

Esses momentos catárticos de encontro com a arte provocavam até sintomas físicos, como os descritos na Síndrome de Stendhal, fazendo o público, ou quem sabe, o povo devoto, sofrer de taquicardia, desmaios, confusão mental e até alucinações só por serem confrontados por toda essa beleza excessiva.

Quando a arte se tornou reprodutível, ela perdeu essa aura e passou a ser algo a ser tratado apenas no plano do racional. Criou-se a avaliação “objetiva” da arte e, oh, heresia!, o questionamento sobre o seu custo-benefício, o qual concentra boa parte da atenção das mídias especializadas. Os autores, artistas, e atores, retirados dessa posição intermediária de arautos dos deuses, se tornaram, eles mesmos, as pequenas divindades às quais se prestavam respeito e admiração e que provocavam em seus fãs, ou fiéis, os sintomas da síndrome de Stendhal, sem a necessidade de haver qualquer contato com ou menção sequer a uma obra de arte.

Porém, mesmo com toda a atividade artística dominada pelo modelo de reprodutibilidade capitalista, há alguns bolsões de liberdade primitiva. Uma delas é o formato das histórias em quadrinhos.

Justamente por ainda não serem ainda tão incensadas como arte, as histórias em quadrinhos ainda têm mais espaço para ousar em seus formatos, (des)continuidades, e soluções narrativas. Seus autores e artistas, também pouco conhecidos, somem frente às suas criações e acaba que a revista em quadrinhos, como um poeta cantando seu poema épico, pode testar diversas iterações conflitantes em busca daquele match perfeito com o público atual, seu contexto específico, e, inclusive, espaço onde se encontrará com a obra. E é nesse encontro, repleto de canaletas entre seus quadros, que a história em quadrinhos permite que os seus leitores se insiram na narrativa gerando experiências únicas e particulares.

O cinema, por outro lado, totalmente inserido na máquina de produção capitalista, tem menos liberdade. E, quanto mais caro e mais ambicioso em seu alcance, menos liberdade tem. Os roteiristas, produtores e diretores precisam, então, dar um salto do momento sagrado e ambíguo da fonte dos quadrinhos, onde tudo é válido, e a história ou revista de um mês não precisa ter nenhum compromisso com o que ocorreu na anterior, para um modelo mais consolidado, compreensível, e que transmite a uma enorme massa a mesma mensagem. Nesse encontro não há quase espaço para o público que precisa ser totalmente absorvido pela experiência proposta na tela.

Enquanto a audiência dos poetas gregos teve acesso a um milhão e um trabalhos de Hércules, para a concisão e entendimento da nossa cultura de massa, todos esses trabalhos não podiam passar do compreensível e reprodutível número de doze.

Ontem, James Gunn, com muita coragem e sensibilidade, quebrou esse paradigma e nos deu espaço para sonhar.

Abdicando da necessidade de se tornar compreensível para um público de massa, ele construiu a sua revista em quadrinhos no cinema. Em vez de ameaçar todo o universo, aumentando cada vez mais as apostas numa mesa imaginária de desastres cósmicos, James Gunn pinçou, ao seu bel prazer, de toda a mitologia disponível, o que de mais humano lhe falava ao coração e apresentou o quadrinho que queria ler com o personagem que o Super-Homem é para ele. E, assim, com essa liberdade e desprendimento dos objetivos financeiros e de continuidade, sim, o filme não precisa fazer parte de franquia nenhuma para ser incrível, ele nos fez lembrar do que o Super-Homem significa para cada um de nós, e provocou, pelo menos em mim, um ataque de Síndrome de Stendhal, que há muito não sentia, me fazendo palpitar, perder o ar, e num determinado momento de pura ligação com humano e o divino, representado pela dualidade desse Moisés moderno, chorar.

James Gunn conseguiu o que muitos não conseguiram pois fez a parte mais difícil do trabalho: ele se deixou ser, e libertou o Super-Homem das estradas em que os estúdios insistem em aprisioná-lo. Pois o Super-Homem não é uma propriedade intelectual que vive em papéis, celuloides, ou servidores, mas uma ideia, uma sensação, e uma verdade que pertence aos nossos corações.

Ontem, James Gunn abriu o Super-Homem do seu coração para nós e nos permitiu libertar o Super-Homem que existe nos nossos. Obrigado, Gunn, por ter matado a divindade que vinha pela estrada e fazê-la renascer mais uma vez humana e divina como sempre acontece ao abrirmos uma revista em quadrinhos.

As inaugurações de Paquetá

A primeira vez em que verti sangue em Paquetá foi no parque Darke. Caminhando depois de ter desenhado o caminho sombreado pelas árvores, uma pequena ponta, de vidro, metal, ou pedra, não pude identificar, atravessou o chinelo fino e furou minha pele. Caminhei mancando até a farmácia onde limpei o pé com água mineral, apliquei Merthiolate e protegi a ferida com um band-aid.

A primeira vez em que passei o ano novo em Paquetá foi na virada de 24/25. Uma noite sem grandes atrações, apesar do divertido show da Roda de Santa Rita, que terminei sem fogos e com a clareza que a passagem de ano, como a de qualquer dia, é um ritual artificial.

A primeira vez em que dormi em Paquetá foi para participar das festas do dia de São Roque. Fazia décadas que não ia à ilha. Levei uma cópia de A Moreninha que li na rede enquanto as pessoas sambavam nas ruas de terra homenageando um santo do qual nada sabiam.

A primeira vez em que as charretes elétricas começaram a circular em Paquetá foi em 2016. Preocupados com o bem estar e com os custos de manutenção dos cavalos que puxavam as clássicas charretes da ilha, a sua utilização foi proibida depois de um longo processo de acordo entre OAB-RJ, Prefeitura e os Charreteiros. Na época foi um choque, mas hoje ninguém se lembra mais daquela época.

A primeira vez em que fui à Paquetá foi aos meus seis anos de idade. Passeei pelos pontos turísticos usuais e, mesmo sem ter a menor perspectiva de ter um amor ou uma namorada sequer, joguei uma pedrinha que ficou estática sobre a pedra dos Namorados. Fora isso a única coisa que me marcou foi o mar sujo e lodoso.

A primeira vez em que Paquetá foi tratado como um bairro da cidade do Rio foi logo após a fusão entre o estado do Rio e o estado da Guanabara. Apesar de ter transitado longamente entre os dois estados em diversos momentos de sua existência, Paquetá ainda continua como um lugar a parte, nem cá, nem lá, com uma lógica única.

A primeira vez em que Paquetá foi iluminada por luz elétrica foi na década de 1920, com cabos da Light & Power vindos de Bonsucesso.

A primeira vez em que Paquetá teve um sistema de coleta e tratamento de esgotos foi em 1912, o que foi uma implementação pioneira em todo o país, seguindo-se à inauguração do sistema de captação de águas do Alto Suruí, em Magé, vindo por dutos submarinos até Paquetá em 1908. Ele substituiu o uso de poços, já que os antigos moradores não dispunham de fontes naturais de água.

A primeira vez em que Paquetá insurgiu contra a República foi na Revolta da Armada em 1893. Durante esse período a ilha foi usada como base de operações dos revoltosos, e foi isolada do Rio de Janeiro por seis meses, o que afastou muitas famílias da localidade. No fim da Revolta muitos moradores foram punidos, acusados de colaborar com os revoltosos.

A primeira vez em que Paquetá foi usada como cenário de um livro foi no lançamento de A Moreninha em 1844. Apesar de não ser explicitamente citada, as descrições dos locais onde se passa a trama coincidem com as paisagens da ilha, permitindo a associação.

A primeira vez em que Paquetá teve um serviço regular de Barcas foi em 1838, o que permitiu a sua popularização como destino de férias e veraneio.

A primeira vez em que Paquetá foi usada como exílio foi quando José Bonifácio, que nomeia uma de suas maiores praias, foi morar em prisão domiciliar na Ilha por motivos políticos após abandonar a corte em 1829.

A primeira vez em que Paquetá foi palco de uma guerra foi durante o embate entre portugueses e franceses que culminou com a fundação da cidade do Rio de Janeiro em 1565. A ilha foi um dos mais importantes focos da resistência França Antártica à expedição de Estácio de Sá.

A primeira vez em que Paquetá foi vista pelos europeus foi na formação da França Antártica em 1555, quando provavelmente recebeu o seu nome que dizem deriva da grande quantidade de pacas na ilha.

A primeira vez em que o que viria a se chamar de Paquetá foi habitada pelos Tamoios se perdeu nos registros das tribos que formavam esse conjunto de povos e foram exterminadas pelos colonizadores e invasores.

A primeira vez em Pacas caminharam sobre Paquetá deveria ser objeto de lendas.

A primeira vez em que a ilha surgiu como formação geográfica provavelmente no período Cenozoico quando a Baía de Guanabara se formou a partir de uma depressão tectônica entre a Serra dos Órgãos e diversos maciços costeiros.

A primeira vez de todas as primeiras vezes de Paquetá sempre será considerada a primeira vez de algo que nunca aconteceu, mas que, futuramente, pode acontecer. Quem pode dizer o contrário? Eu? Você? Melhor, pela primeira vez, deixar pra lá.

Notas (de rodapé) sobre Paquetá

Paquetá é uma encantadora1 ilha localizada no coração2 da Baía de Guanabara, a aproximadamente 15 quilômetros do centro do Rio de Janeiro. Seu acesso é feito por barcas que partem em horários regulares3 da Estação Praça XV, proporcionando aos visitantes uma travessia tranquila e cênica até esse refúgio singular.

Originalmente habitada pelos indígenas Tamoios, a ilha foi ocupada por colonizadores portugueses4 a partir de 1555. Durante os períodos Colonial e do Império, Paquetá foi um importante ponto de veraneio para a elite carioca e figura constante na história do Brasil, abrigando personalidades como D. João VI e José Bonifácio, o Patriarca da Independência, que chegou a residir na ilha5.

Um dos grandes orgulhos de Paquetá é seu papel na literatura brasileira: a ilha é cenário do primeiro romance do romantismo nacional, A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo6. Inspirados pela obra, diversos pontos turísticos homenageiam o livro, como o Mirante da Moreninha, a Pedra da Moreninha e a Praia da Moreninha, além de construções históricas que remontam à época retratada na narrativa7.

A partir do século XX, Paquetá consolidou-se como destino de férias e fins de semana para os cariocas em busca de uma atmosfera serena, quase atemporal. Suas ruas de terra batida8, sua arborização exuberante e seu ritmo tranquilo9 remetem a um passado preservado.

Um dos maiores encantos da ilha é o fato de que, até hoje, não se permitem carros particulares10. Antigamente, o transporte era feito por charretes puxadas por cavalos. Atualmente, com o objetivo de preservar o bem-estar animal, os cavalos foram substituídos por charretes elétricas, triciclos e pequenos veículos sustentáveis, apelidados carinhosamente de “tuc-tucs”11.

Embora mantenha seu espírito nostálgico12, Paquetá tem atraído novos moradores — jovens, artistas e profissionais em busca de qualidade de vida e contato com a natureza, sem abrir mão da proximidade com a capital fluminense. A recente melhoria da balneabilidade de suas praias13, aliada ao florescimento cultural representado por eventos locais e blocos de carnaval como O Boto Marinho e A Pérola da Guanabara, tem despertado crescente interesse na ilha.

Esse novo ciclo, no entanto, levanta debates sobre o futuro de Paquetá. O aumento do turismo e da procura por imóveis pode levar a um processo de gentrificação14 que transforme suas características essenciais. Por isso, visitar Paquetá é também um convite à valorização e à preservação de um lugar onde o tempo parece passar mais devagar e a história caminha ao lado do presente15.

O eterno ciclo

Renascimento

O império, enfim, renasceu. Porém isso não foi surpresa. Seu destino auspicioso já estava escrito na sua origem. Seus fundadores, egressos do império anterior, com o qual tinham aprendido tudo de bom e de mal que o poder pode proporcionar, estavam, desde seus primeiros passos, destinados à gloria. Evitando os erros do passado, e almejando repetir os acertos dos seus antecessores, ele construíram uma versão melhorada e, alguns dizem, definitiva de como o poder deve se estabelecer de maneira justa e igualitária entre todos os que são verdadeiramente iguais. Sob a aclamação do povo, os fundadores, já idosos, passaram, assim, a tocha às novas gerações que iriam perpetuar a sua grandeza. Essa era a exaltação não só desse, mas de todos os outros impérios que antes dele vieram e dos quais eram descendentes, diretos e indiretos. Nas praças públicas, nas igrejas, nas montanhas e planícies, a voz das pessoas ecoava o momento histórico. Diziam, cantavam, oravam, com fé e esperança, que o Poder, na forma como fora originalmente concebido pelos deuses para ser exercido pelos seres humanos, enfim, renascera.

Vita imperium aeternum!

Morte

O império, enfim, morreu. Porém isso não foi surpresa. Seu destino trágico já estava escrito na sua origem. Seus fundadores, egressos do império anterior, com o qual tinham aprendido tudo de bom e de mal que o poder pode proporcionar, estavam, desde seus primeiros passos, destinados ao fracasso. Se esmerando em reciclar os erros do passado, e evitando repetir os acidentais acertos dos seus antecessores, ele construíram uma versão piorada e, alguns dizem, verdadeira de como o poder é: sempre injusto e desigual, privilegiando alguns canalhas, dentre todos os que deveriam ser verdadeiramente tratados como irmãos. Sob as vaias do povo, os fundadores, já mortos, foram amaldiçoados, e as últimas gerações que perpetuaram sua maldade, punidas. Esse era o expurgo final, não só desse, mas de todos os outros impérios que antes dele vieram e dos quais eram descendentes, diretos e indiretos. Nas praças públicas, nas igrejas, nas montanhas e planícies, a voz das pessoas ecoava o momento histórico. Diziam, cantavam, oravam, com fé e esperança, que o Poder, na forma como fora pervertido pelos humanos para ser exercido em benefício de poucos e no malefício de tantos, enfim, estava extinto.

Mors imperium aeternum!

[quod vita est]
[repetere]

Centro

Há centro nenhum.

No meio de tudo, há centro nenhum, apenas as margens existem.

Muito se engana, quem busca por uma causa central. No meio de tudo, há centro nenhum, apenas as margens existem. O contexto é feito de bordas, apenas as arestas seguram o mundo.

A ansiedade por uma explicação central é que gera a ilusão de que tudo emana de apenas um ponto. Esse ponto é uma fantasia que só atende à nossa segurança psicológica que busca simplificar a insustentável complexidade do mundo.

Muito se engana, quem busca por uma causa central. No meio de tudo, há centro de nenhum, apenas as margens existem. O contexto é feito de bordas, apenas as arestas seguram o mundo.

Essas arestas sem nodos, num balé constante de inequívoca mutação, dão as formas que atribuímos ao mundo. Porém não há um ponto nevrálgico, ou alvo que proverbiais balas de prata possam atingir para tornar tudo melhor.

Muito se engana, quem busca por uma causa central. No meio de tudo, há centro nenhum, apenas as margens existem. O contexto é feito de bordas, apenas as arestas seguram o mundo.

No meio de tudo, há centro nenhum, apenas as margens existem.

Há centro nenhum.

Centro.

O nome do elefantinho

Uma função do nome que a gente costuma esquecer é servir de escudo. En geral, o que tem nome está protegido. Dentro da granja, todas as galinhas são potencial canja; menos a Giselda, que você cuidou quando nasceu fraca e, um dia, por esse apego, acabou dando um nome pra ela. Por isso há uma diferença entre os animais domésticos, que servem à, e são servidos na casa, e os animais de estimação, que você ama e, notem, sempre tem um nome.

O mesmo serve pras pessoas. Quando elas tem nome, matá-las se torna assassinato; quando elas são uma categoria, apenas baixas de guerra. Racistas e homofóbicos; intolerantes e preconceituosos; militares e militaristas se apropriam dessa tática cognitiva não só ignorando o nome dos outros, mas tirando os nomes que os outros tem, e os substituindo por alcunhas. Assim matam as pessoas incluídas nas categorias que acham diferir deles sem nenhum peso nas consciências que fingem ter.

Agora descobriram que os elefantes tem nomes que eles mesmos dão uns ao outros. Quando descobrirmos que todos os animais tem nomes, será impossível não se render ao vegetarianismo, a não ser, óbvio, aos sociopatas. Afinal, toda sociopatia começa quando negamos ao outro o direito a um nome.

Dessa forma, toda a generalização seria um ato de guerra; e toda a particularização, um ato de misericórdia. Talvez, quando Deus disse ao homem, no Éden, para dar nome aos animais, o propósito não era dominá-los, mas torná-los objetos da sua estima. Fica a dica: nomeie algo e o ame, hoje.