Uma vez, no meio de um pacote de livros, me enviaram, de surpresa, dois squishy toys insólitos: um coração e um cérebro. A princípio não fiz nada com eles, mas, com o passar dos anos, eles acabaram assumindo funções bem específicas. O cérebro está no meu trabalho, em perfeito estado, ao lado do Gênio dos Smurfs, para não me deixar esquecer que é preciso, sim, usar a cabeça, mas sem querer ser esperto demais; já o coração, ah, coitado!, ficou solto pela minha casa, sem função definida, até que os gatos o acharam. Depois disso, ele some e reaparece, quando menos se espera, num estado cada vez pior.
Sempre que esbarro de surpresa com ele pelo chão, coberto de mordidas e pelos de gato, me pergunto se, enquanto meu cérebro tá lá preservadinho no trabalho, eu não estaria olhando para um vodu do meu próprio coração, mais estropiado a cada dia. Normalmente, o pensamento me passa direto pela cabeça e não volta. Porém, hoje, depois de reaparecer sem aviso, quase irreconhecível na boca da minha gata, resolvi guardá-lo num lugar seguro para protegê-lo das unhas e mandíbulas dos gatos e das ansiedades geradas pelas minhas superstições.
Óbvio que tudo isso não passa de uma manifestação dos meus medos da morte, e da patente discrepância de atenção que dou ao meu conhecimento e às minhas emoções, mas vai quê? Não custa nada usar o cérebro para proteger o coração.