Em toda festa à fantasia, seja nas de halloween, carnaval, ou mesmo nas sem um propósito específico, ela sempre ia vestida de Xerife. Se atochava numa roupa de cowboy dois números menor que o dela; colocava um chapéu de couro marrom; apoiava nos quadris um coldre com revólveres de plástico; e metia no peito, bem na altura do coração, uma estrela brilhante. Estava pronta pra ser a Xerife da festa.
Quando lhe perguntavam por que sempre repetia a mesma fantasia, ela retrucava:
— Repetir não, respeitar o meu nome. Com essa alcunha que mamãe me deu, que outra fantasia eu poderia vestir?
Ela tinha uma certa razão. Pra alguém chamada Norma, ir pras festas vestida de Cowboy fazia todo o sentido. Especialmente quando ela sacava seus revólveres e repetia o slogan que aprendeu quando estagiou na Associação Brasileira de Normas Técnicas:
— Onde não existe a Lei, existe a Norma.
Era perfeito, não?
Calhou que essa história da fantasia, com slogan e tudo, começou a circular, e algumas outras Normas começaram a ser questionadas por que não se vestiam de Xerife. Não adiantava darem mil explicações, sempre eram obrigadas ouvir a mesma ladainha:
— Pô, mas você ia ficar ótima de Xerife.
— Cara, o slogan diz tudo.
— Na boa, não faz todo o sentido?
Claro que fazia, mas todo mundo tem, ou pelo menos deveria ter, o direito de ir às festas com a fantasia que mais lhe agradasse. No início, as Normas resistiram, mas, pouco a pouco, uma a uma, elas foram aderindo.
— Uau! Eu não te disse?
— Ficou incrível! É a tua cara!
— Vai, agora fala o Slogan! Vai ser per-fei-to.
Em breve, a fantasia de Xerife foi se tornando uma indicação para todas as Normas. Porém, quando a disseminação da prática atingiu um determinado nível, as exceções começaram a ser alvo da indignação dos outros convidados:
— Ué? Cadê a fantasia de Xerife?
— Eu pensei que…
— Olha, era melhor que você….
Em pouco tempo, o que era norma social passou a se tornar obrigação, quase uma lei.
A Norma original, quando viu a sua ideia, antes, também, original, ser tão imitada, começou a se incomodar. Resistiu na sua fantasia e no slogan, esperando que as demais Normas cansassem da onda, mas parece que a moda veio mesmo pra ficar. Assim, vencida, como não queria parecer mais uma, apesar de ter sido a primeira, ela simplesmente abandonou a fantasia e passou a ir às festas vestida de várias coisas diferentes. Quando lhe perguntavam por que abandonara o figurino, tinha outro slogan na ponta da língua:
— O objetivo principal da Norma, queridos, é quebrar a Norma.
E, assim, como não podia deixar de ser, mais uma vez, para o prejuízo de todas as outras Normas, a Norma criou uma nova norma.
Adorei, e lembrei na hora!