Acompanhei essa eleição com muita atenção. Mesmo sabendo que não iria votar, quis ler e buscar por trás da cortina de fumaça da propaganda eleitoral por que diabos estamos lutando. É, lutando. Nas redes sociais, nas mesas de bar, nas festas de criança, nos restaurantes a quilo no intervalo de almoço do trabalho; estamos lutando. Ferozmente. Os ânimos, ninguém pode negar, estão elevados e há agressividade em cada vírgula não pronunciada. Essa eleição, mais do que qualquer outra que vivenciei, parece expor uma fratura na nossa sociedade. E ela vai muito além do bipartidarismo fake PT-PSDB. Se ouvirmos apenas as vozes mais radicais de ambos os lados, como uma grande generalização, óbvio, podemos considerar esse conflito político(?) como uma grande luta de ratos famintos.
De um lado os ratos que apoiam o PT pois consideram que os ratos da classe média/alta(?), para manter seus benefícios e sua upper hand, não querem apoiar os ratos mais pobres a subir de vida, aumentar sua capacidade de consumo e melhorar seu nível educacional. Para eles é uma luta para equalizar os competidores.
Do outro, os ratos que apoiam o PSDB. Esses consideram que os ratos mais pobres estão tomando a parte que lhes é devida como verdadeiros(?) produtores de riquezas. Os programas assistenciais devem ser reduzidos, modificados ou abolidos para focar em melhorar as condições de produção e só assim, por mérito próprio, os ratos mais pobres terão condições reais e justas de competir. Para eles é uma luta para equalizar o ambiente de competição.
Se os argumentos de ambos os lados forem expressos de forma sensata e sem radicalismos, não é difícil concordar com as duas vias. As razões de todos são válidas. Afinal, como bem dizia um grande amigo meu, todo mundo tem razão: sua própria razão.
Dado que ambos os caminhos são adequados, a discussão dessa eleição seria sobre qual deles é mais adequado para o ATUAL contexto. O que é melhor? Capitalizar os blue collar ou dar mais condições de investimento para os white collar. Sim, se formos pensar de uma maneira bem industrial, o conflito que se estabelece na manufatura Brasil é entre os operários e os executivos. Quem deve ser priorizado e quem deve ser preterido nesse momento para o bem coletivo?
Infelizmente não é esse o tom da conversa. Aparentemente, cada grupo de ratos parece supor que o outro quer a sua extinção total. Ao invés de discutirmos acordos, propostas e estratégias para a convivência desses grupos nesse ambiente desigual, estamos defendendo com unhas, dentes, tweets e posts no facebook a nossa própria sobrevivência.
Apesar de compreender essa rixa, estranho muito que uma terceira parte pareça estar fora do conflito. É, onde estão os donos da fábrica nessa discussão?
Enquanto os trabalhadores (operários e executivos) lutam, se tornando vigias e torturadores uns dos outros, os donos das fábricas estão só esperando qual lado(?) vai ganhar para influenciá-lo e dobrar suas propostas ao seu favor. No final dessa luta, os dois lados perdem, mesmo que haja pequenos avanços para fazer valer a ilusão de que foi feita uma escolha.
Por isso, antes de discutir com seu amigo, colega, inimigo ou mesmo com um completo estranho, lembre, vocês dois estão do mesmo lado e toda essa eleição não passou de uma bela distração e de uma terrível maneira de cansar os ratos, nos colocando para lutar ao invés de atacarmos àqueles que realmente nos oprimem. Dessa maneira, quando e se, um dia, todos nós, os ratos, resolvermos lutar contra os verdadeiros opressores, estaremos cansados o suficiente para nos tornar presa fácil dos gatos que eles tão bem sabem usar.
Enfim, meu grande problema com essa eleição é que ela não tem nada de mudança de política. Nem pra mudar mais do mesmo, nem pra mudar o que há. É apenas uma pequena discussão de como manter viva essa arena de competição fictícia. Ambos os lados apoiam a mesma cartilha: dinheiro, consumo, culto à personalidade, ignorância, violência, repressão, poder e competição. Como na Fazenda dos Animais, estamos apenas escolhendo quais porcos irão manter escrito na parede do nosso estábulo o mandamento que até hoje domina as nossas relações: “4 pernas bom, 2 pernas melhor”.