Dê um passo para trás. Vá à sua estante. Pegue um livro ao acaso. Abra as suas páginas. Leia uma, duas, em ordem. Leia uma outra, ao acaso. Folheie. Passe pelas páginas, apenas correndo seus olhos. Abstraia do conteúdo. Perceba apenas as posições: do texto, das notas, das margens, das imagens. Entenda que, mesmo que não haja harmonia, você consegue perceber na estrutura do livro uma expectativa, ou, para alguns, uma presunção, de perfeição. O livro, em sua estrutura, na sua sequência, no seu formato, mesmo que o seu conteúdo e sua organização não correspondam a esse destino, foi criado para ser a moldura perfeita para o nosso conhecimento. A pergunta é: o livro é perfeito pois atende à nossa cognição, ou é perfeito pois fomos ensinados a ver a perfeição nele?
Mesmo nos livros que consideramos perfeitos, dependendo da cultura de origem, dependendo dos leitores que visamos atingir, algumas estruturas básicas mudam. De um hemisfério para outro, uns leem da esquerda para a direita, outros, da direita pra esquerda. Para alguns públicos, o excesso de espaço negativo é um atrativo, para outros, um desperdício. As relações entre as cores, os tamanhos, as formas, a disposição das imagens e do texto, por mais que atendam a estruturas matemáticas e biológicas que governam a nossa percepção, geram maior sensação de sentido e harmonia para algumas gerações, para algumas culturas, para alguns tipos de leitores do que para outros. Enfim, lemos como lemos, pois assim é o natural, ou pois assim fomos ensinados?
Na busca pela perfeição, pela estrutura perfeita que irá nos possibilitar a imersão completa nesse mundo das ideias (ficcionais ou não), testamos novos grids que cheguem a essa utopia, ou olhamos para o passado, considerando já perfeito o que surgiu “naturalmente”, para dali extrair os cálculos que nos digam como os livros podem ser áureos, pelo menos no seu layout.
Porém, essa discussão é espúria. Buscar ou esmiuçar a perfeição são tarefas sísificas. Afinal, nossos textos e criações talvez se encaixem tão bem nessas estruturas pois elas, de alguma maneira, estruturam o formato do nosso pensamento e, por conseguinte, da concepção das nossas obras. Por isso, cada novo conteúdo tem a possibilidade de sugerir novos formatos e novos caminhos a seguir no Design Editorial.
O próprio livro, como o conhecemos, é coisa nova. Sua popularização não chega a 500 anos. Antes tivemos outros formatos para a entrega desses conteúdos. Partindo da voz, passando por tábuas, pergaminhos, e chegando hoje ao livro digital. Podemos dizer que algum desses formatos é mais perfeito que o outro? Ou acusar algum deles de ser imperfeito? Se todos podem ser perfeitos, por que não perduraram?
Agora, dê um passo para frente. Imagine um mundo, ou um universo, em que somos uma entre várias espécies, não só sencientes, mas que leem. Como serão livros criados para atender a uma cultura, não simplesmente global e humana, mas universal? Como será a perfeição numa outra época, para outras culturas, e para outras espécies que percebam a luz, o espaço, e o tempo de formas diferentes?
É impossível buscar a perfeição no livro, pois a sua perfeição deriva justamente de ele ser efêmero e mutante. A maior perfeição do livro não está no que ele é, mas em todas as possibilidades que ele, enquanto conceito, encerra. Que venham suas novas versões.