Camas carregam sonhos. Depositamos nossos sonhos nelas. Se a cama é sua, os sonhos são seus. Se não, os sonhos são de outro alguém.
Por isso, sempre me disseram: não compre camas e, especialmente, colchões usados. Você vai sonhar o sonho de outras pessoas, como se ele fosse seu. Acredite. Eu sei disso, pois já cometi esse erro e paguei caro por ele. Melhor não entrar em detalhes.
O mesmo vale para hotéis.
As camas de hotéis carregam os sonhos de todos que dormiram nelas. Por isso os sonhos que sonhávamos em viagens, de trabalho ou de lazer, quando elas haviam, sempre eram confusos, como se o inconsciente de alguém estivesse adentrando o nosso, ou vazios, como se o excesso de experiências e desejos que por lá passaram gerassem um ruído branco surgido da combinação de todos os sonhos da Terra.
Talvez seja por essa razão que aqueles que viajam profissionalmente vão adquirindo aos poucos um olhar vazio, como se não soubessem mais o que querem, esperando reencontrar seus sonhos na próxima cama onde forem deitar.
Já me senti assim. Já fui um caixeiro viajante da educação.
Depois de longas semanas dando treinamentos em lugares distantes, quando voltava de viagem e deitava novamente na minha cama, sentia como se os meus sonhos, os meus próprios, voltassem com mais força. Neles surgiam pessoas esquecidas e os conteúdos, antes latentes, ficavam cada vez mais manifestos. Eu lembrava quem eu era e sempre me surpreendia. Para o bem e para o mal.
O ideal é que tivéssemos camas descartáveis onde pudéssemos depositar sempre sonhos inéditos; camas que nos permitissem acordar sempre novos e prontos para uma vida diferente. Infelizmente, os sonhos, como as camas, são pesados. Cheios de memórias e identidades que assumimos pelos caminhos que nos levaram a elas. Esses sonhos não podemos abandonar.
Assim, só nos resta depositá-los a cada noite entre as costuras de nossos colchões e torcer que eles fermentem durante o dia para nos dizer, durante o nosso descanso, para onde devemos caminhar quando acordarmos.
É com isso que sonho.