Não sei exatamente há quanto tempo o filme foi lançado mas até agora não vi Os Vingadores. Acredito que alguns que me conhecem estejam muito espantados com essa afirmação, logo eu, mó fã de quadrinhos, ainda não vi os Vingadores? É, verdade, e, pra aumentar ainda mais a sua surpresa, confesso: não estou lá muito animado a assistí-lo. O problema, acredito, não está com os heróis mais poderosos da Terra, mas com o cinema como um todo. Não sei como vocês tem lidado com o cinema atualmente mas eu tenho me sentido cada vez menos inclinado a ir.
Quando penso no meu retrospecto de vida, isso se torna ainda mais estranho, pois eu tinha o costume, até meados dos anos 90, de ir e muito ao cinema. Eram umas 4 a 5 vezes por semana, sem contar os filmes das locadoras. Eu realmente tinha uma dieta cinematográfica bastante variada e substanciosa. Hoje, só a idéia de pisar num cinema já me manda calafrios por todo o corpo.
As razões não são claras. Eu poderia assumir uma postura esnobe e falar que o cinema de hoje não chega aos pés do cinema de antigamente, o que é parcialmente verdade, mas essa não é uma explicação válida na medida em que eu via uma imensa quantidade de porcaria no passado. Eu assumia com orgulho gostar de frequentar os maiores muquifos para assistir às maiores bombas. Nunca esquecerei, por exemplo, de uma sessão de Maniac Cop 2 onde fiquei por quase duas horas agachado na poltrona por conta dos ratos que circulavam pela sala escura. Não dá pra negar, naquela época, eu realmente tinha tesão pelo cinema.
Talvez possa culpar o excesso de conteúdo ao qual somos submetidos, com nossa completa cumplicidade, pela tevê a cabo e pela internet, ou, quem sabe, as discussões fúteis e repetitivas nas redes sociais da vida. Mas nada disso explica por que o cinema não tem pra mim o mesmo gosto de descoberta que tinha antes.
Antigamente, fosse o que fosse, do mais famigerado filme B, ao novo Indie da Miramax, passando pelas comédias romântica blockbusters, eu assistia a tudo. Hoje, Os Vingadores me esperam a 4 quarteirões de casa e eu nem me esforço pra vê-los. Desculpe, heróis.
O problema realmente deve ser comigo. Muitos dos meus amigos ainda tem esse afã de ir ao cinema. Alguns ao ponto de assistir a e gostar de O Lanterna Verde. Mas comigo isso não rola mais. O cinema meio que se tornou uma obrigação: “Você ainda não viu os Vingadores? Mas todo mundo viu!” “Não, não vi e daí?” sinto vontade de responder, mas não o faço, pois sei que estou descontando nos outros a frustração de não ter mais o prazer com o cinema que tinha antigamente.
Apesar desse embotamento emocional, algumas vezes, felizmente, eu sinto um certo lampejo do prazer do passado ao descobrir um filme pequeno e pouco conhecido com o qual posso conversar com os outros livre da postura de crítico de cinema de 140 caracteres. Recentemente senti isso com Tiny Furniture.
Não tinha lido nada a respeito, não conhecia os atores, diretores ou roteiristas. Não tinha expectativas. Fui de peito aberto ao filme, quer dizer, lhe assisti de peito aberto pelo NetFlix. Assisti, gostei bastante e tive alguns questionamentos sobre o tema e sobre algumas decisões estéticas. Não comentei com ninguém. Ficou pra mim. Se alguém me pedir uma indicação de um bom filme, recomendo, mas não preciso criticá-lo nos Get Glue da vida.
Talvez seja disso que sinta falta. Antigamente, por mais pessoas que assistissem aos filmes conosco, todos tinham direito às suas opiniões, afinal, o filme é, ou pelo menos deveria ser, uma experiência pessoal. Lembro com prazer de ter assistidos a filmes hiper pedantes e chatos só pra poder discutí-los em mesas de bar sem a pressa ou obrigação de chegar a conclusões. Hoje, a crítica da experiência parece mais importante que a experiência em si e a necessidade de closura cognitiva é mais importante que a ambiguidade. Não mais vivemos os filmes; os consumimos, categorizamos e esquecemos. A impressão que dá é que as experiências que vivemos só servem para alimentar uma grande máquina de recomendações que, em prol de um consenso impossível, busca desesperadamente por uma unanimidade burra. A Arte deixou de ser prazer e se tornou o segundo emprego de todos nós. E o pior, um emprego chato.
Ainda não tenho uma resposta. Não sei o que me incomoda hoje tanto na experiência de ir ao cinema, mas sei o que me incomoda no público a minha volta: a sua insistência em poluir a minha experiência tentando conseguir a minha concordância para a sua opinião. Quando perguntados por que gostamos ou odiamos algo, deveríamos, ao invés de discorrer criticamente ou mencionar o que lemos por aí, nos sentir à vontade de encerrar o assunto com um simples “Porque sim”. Afinal de contas, não é essa a resposta mais sincera que podemos dar?
Li, às vezes sinto essa decepção/frustração também. Acho que o problema não é o cinema porque a decepção/frustração acontece em outras situações também. O problema maior é a sociedade. Minha tolerância para aturar pessoas está cada vez mais perto do zero. Detesto gente.