Ficção

Como ser meu amigo

Meu amigo mais antigo, quando me conheceu, veio falar comigo só para me espezinhar. Acompanhado por um grupinho de arruaceiros de 4 anos, no meu primeiro dia de aula em um colégio novo, me perguntou ironicamente por que eu estava usando saia.

– Não é saia, é bermuda, seu idiota- esclareci gentilmente.

Pouco tempo depois, não me lembro como, nos tornamos amigos, mas continuamos a brigar e a competir. Nos apaixonamos pela mesma menina na Classe de Alfabetização e quando ela e sua família foram visitar minha mãe no hospital, depois da sua histerectomia, ele lamentou comigo:

– Que sorte que sua mãe teve câncer.

O pior é que entendi seu comentário.

Esse padrão de abuso se repetiu em todas as amizades importantes da minha vida. Raiva, birra, ranço, rivalidade, inveja, ódio e desprezo foram as emoções mais comuns nos primeiros encontros com tantos que se tornaram meus amigos do peito. E, depois, os relacionamentos mantinham um equilíbrio perfeito de animosidade amistosa que garantia surpresa e diversão nas nossas interações.

Na verdade, sempre desconfiei de gente amigável. Me dá a impressão que fazem pouco da minha pessoa ou querem se aproveitar de mim. Quer me conquistar? Entre em conflito comigo. Vejo sinceridade na negatividade de suas emoções. Como uma harpa afinada, a amizade harmoniosa necessita de tensão nas cordas e toques violentos para funcionar. Boas maneiras e gentileza são, para mim, sinal de gente pouco imaginativa, chata ou falsa. Que monótono deve ser conviver com gente que concorda contigo.

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