Ensaios

Deixe de ser patriota, pergunte me como

Todo país é uma farsa. Você prende um bando de gente num território; estabelece fronteiras artificiais para “impedir” o uso dos recursos naturais dessa terra por gente que você não gosta; define um modelo de governança que lhe dê vantagens sobre o restante da população; controla a circulação de valores inventando um dinheiro que só você pode imprimir; e tira da cartola uma fantasia romântica sobre essa conjunção de povo e terra, desenha uma bandeira pouca imaginativa, escreve uma marchinha safada, que chama de hino, e dá a isso o nome de cultura. Presto! Temos um país.

Pessoalmente, prefiro o método Marina Lima “você me abre seus braços” de criação de país, mas esses passos acima normalmente são os que as pessoas seguem para criar essas fantasias patrióticas que dividem o mapa-múndi como um livro de colorir para adultos com baixa capacidade cognitiva.

Nenhum problema em acreditar em coisas que não existem. Religião e Super Heróis fazem sucesso até hoje e são, pelo menos no segundo caso, fantasias basicamente inócuas. O problema é que os países, assim como os relacionamentos românticos, na acepção do Miguel Falabella, são como submarinos: até bóiam, mas são feitos para afundar. E o seu fracasso se dá justamente pela fantasia romântica que gera aquele sentimento patológico de submissão chamado patriotismo. Se encararmos a nossa relação com os países, e até com as pessoas, com mais pragmatismo, só teremos a ganhar. Em vez de ficar sofrendo com problemas que achamos decorrentes da “cultura” ou do “jeito de ser” do “brasileiro”, por que não resolvê-los deixando as emoções de lado?

Exemplo? Dou até dois.

Primeiro: o país é ingovernável. OK, divide o território. Pra que ter um país desse tamanho? Porque a gente fala português? Valha-me, Deus. É só manter uma estrutura compartilhada mínima de relacionamentos, definir constituições estaduais respeitando os grupos populacionais mais próximos, suportar sistemas educacionais e de saúde compartilhados, e montar um mercado comum entre esses estados para organizar e pronto. Ah, e aproveitando podemos acabar com as forças armadas, que, no nosso caso, são apenas um tipo de decoração que só atrapalha.

Segundo: os governantes se locupletam e não pensam no bem estar da população. OK, vamos transformar o poder em ônus e não em bônus. Em vez de basear a concessão das chaves do reino nesse concurso de popularidade disputado por gente feia e burra, vamos sortear os cargos atualmente eletivos. Tenho certeza que seria impossível sair com um presidente pior do que o que temos atualmente. Ah, e a democracia? Relaxa, o povo vai votar. De 2 em 2 anos, votamos se esses sorteados estão fazendo um bom trabalho ou não. Os que fazem um bom trabalho são retirados do governo e do sorteio para sempre, os que não fazem são exterminados em praça pública. Duvido alguém mais querer ser político.

Viu? Facinho de resolver. É só deixar as fantasias megalomaníacas ou paranóides de lado que rapidinho a gente acha uma solução pra tudo.

Se a gente tivesse menos romantismo com essa construção torta, essa colônia passada de pai pra filho, e movida aos trancos e barrancos através de sucessivos golpes de estado capitaneados por forças armadas ociosas e com fantasias de poder, a vida seria mais fácil e melhor. Abandonar a fantasia de futuro brilhante para esse conjunto de território e população é o melhor caminho para aprendermos a viver confortavelmente com a nossa mediocridade. E isso se aplica a todos os países do mundo.

Afinal, o Brasil, como o restante da comunidade mundial, não tem um destino manifesto. Isso é só conversa de vendedor de carro usado pra te empurrar um acordo ruim, contando com a ideia que você sente orgulho por algo que não existe: ser brasileiro. Patriotismo é uma fantasia tão fora da realidade quanto discutir se o Capitão América é melhor que o Homem de Ferro. Viver em comunidade, sem firulas e com autocrítica, é que são elas.

Agora, se você não concorda com nada do que eu disse, fique à vontade para sair de camisa do brasil, fazendo arminha com a mão, e apoiar um genocida que se diz um Messias para se apropriar do erário nacional e favorecer sua família de incompetentes e seus amigos milicianos. No seu futuro, como no do Brasil, eu só vejo remorso e dor. Eu, por outro lado, decidi viver com consciência, sem sujar as minhas mãos de sangue defendendo gente que não merece meu respeito. Eu preferi ser pragmático a ser patriota. É a maneira mais ética e mais racional de se viver, pode acreditar.

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