Ficção

Amigos de bar

A gente se conhece assim: pedindo o isqueiro pra acender o cigarro, ou pedindo um cigarro pra acender o isqueiro; perguntando se a mesa tá ocupada, ou perguntando se pode sentar na cadeira vazia; querendo saber se o outro está na fila da cerveja, ou se alguém está usando o banheiro; se intrometendo na conversa alheia por excesso de conhecimento ou pura ignorância, ou recebendo um comentário pertinente ou totalmente descabido sobre uma conversa que o outro não deveria estar ouvindo.

A gente se conhece assim: numa troca de favores. E abusos.

De favor meu em favor seu, de abuso nosso em abuso vosso, a nossa amizade vai se construindo e, entre uma cerveja e muitas, a gente nem lembra como se conheceu. Muitas vezes a gente não lembra nem o nome um do outro, mas nunca deixa de se cumprimentar na rua.

“Fala, cara, e aí, tudo bem?”
“Tudo, e você, cara, como vai?”

E se nos perguntam, espantados com a nossa sintonia, como tudo começou, respondemos sem pudor:

“Foi aqui. É, no botequim. Como foi? Ah, na boa, a bebida não me deixa lembrar.”
“É, total.”
“Total.”

E em homenagem à amnésia e à amizade, pedimos outra rodada pra continuar a conversa que não pode parar.

“Pô, cara, agora, sério, como a gente se conheceu mesmo?”
“Ah, se tu não lembra, irmão, tu a acha que eu vou lembrar?”

Fala aí

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