Destaque Ensaios

A vassoura atrás da porta

Receber é uma arte. Expulsar também. E nisso meu pai era um mestre; na segunda arte, quero dizer. Quando as visitas passavam do tempo que ele considerava regulamentar, ele se recolhia no quarto sem falar com ninguém. Algumas vezes, no caminho para a cama, depois de levar copos e pratos ruidosamente para a pia, ele varria a sala, esbarrando de propósito nos pés dos convidados, e depositava a vassoura atrás da porta, como mandava a…

Continue reading

Ficção Poesia

Amanhecer

Ontem, a gente via o nascer do sol do outro lado, do lado daqueles que ainda não tinham dormido. Voltando de boates e bares, encharcados de álcool e conversas essenciais, seguíamos de carona em carros de desconhecidos em direção a casas que não fossem as nossas. Abríamos janelas e geladeiras na busca vital por ar e pela última dose; ligávamos televisores e cd players como trilha sonora para nossas últimas investidas amorosas; nos esparramávamos em…

Continue reading

Destaque Poesia

AI DE TI, Copacabana – versão bicentenário da Independência

Desculpa, Rubem Braga. 1. AI DE TI, Copacabana, porque já deixaste claro que nem ligou que passou teu dia, e, pior, até fizeste a egípcia; porém não receberás de mim nem um áudio de whatsapp de lamentação. 2. Ai de ti, Copacabana, porque a ti chamaram Princesa do Mar, mas, em nome dos bons costumes, tiraram da tua fronte a socorredora coroa de sedução; e calaram as tuas belas risadas ébrias e vãs que ecoavam…

Continue reading

Ensaios

Ainda há vida inteligente na Internet

No início da internet, quando não havia buscadores para encontrar anúncios vagamente relacionados ao que a gente procurava, nem mídia social para nos empurrar lixo pela goela, a gente comprava livros e revistas para descobrir para onde ir pelos mares nunca dantes navegados do ciberespaço. Uma das referências mais legais da época era o Net Guide, publicado nos anos 90, e do qual eu tenho a edição de 1994. Nas 360 páginas dessa edição, indo…

Continue reading

Ficção

Esotérico

Sempre, quando a festa começava a chegar ao fim, os amigos pediam: – Toca esotérico. Esotérico. Toca esotérico. E o pedido nunca era para um, nem para o outro. Era um pedido pros dois. Eles, mesmo brigados, por motivos dos quais não lembravam mais, sorriam pros amigos, com sinceridade, e um pro outro, com falsidade, e buscavam seus violões. Sentavam-se um ao lado do outro, mas afastados, e tocavam. Não precisavam de deixas ou marcações.…

Continue reading

Ensaios

O discurso final

Agora que a janela de filiação partidária fechou e os quadros eleitorais estão quase fechados, vamos focar no que interessa: o discurso de fechamento dos debates eleitorais. Com a perspectiva de que os principais candidatos fujam deles, ainda resta a esperança de que, aos moldes de Leonel Brizola, alguém faça um discurso histórico para fechar esse terrível período da nossa história. Afinal, até os fãs do Iron Maiden sabem, discursos históricos são eternos e nos…

Continue reading