
O sebo que ajudei a criar mudará de lugar
Devido aos escorchantes alugueis cariocas, a loja, que foi batizada com um trocadilho infame baseado no seu endereço, deixará a Barata Ribeiro e sentará praça em Botafogo na Paulino Fernandes. Continue lendo
Lisandro Gaertner
O sebo que ajudei a criar mudará de lugar
Devido aos escorchantes alugueis cariocas, a loja, que foi batizada com um trocadilho infame baseado no seu endereço, deixará a Barata Ribeiro e sentará praça em Botafogo na Paulino Fernandes. Continue lendo
No meio da madrugada, os insones do twitter tem as melhores conversas. Dessa vez quem puxou o tema foi o @gut0. No meio da leitura do The Great Good Place, fui obrigado a responder:
@gut0 O facebook é o novo bar. Um lar longe do lar. Não é como esse, mas tem gosto pra tudo. https://t.co/IV7CBu8XQI
— Lisandro Gaertner (@lisandro) January 16, 2015
Sou, como muitos devem saber, um entusiasta dos bares. Passei de 62,3 a 78,4% do meu curso universitário em um deles. E lá, sou obrigado a confessar, aprendi muito mais sobre psicologia do que em muitas das cadeiras acadêmicas. Contudo, acho que hoje em dia, excetuando-se um local ou outro, os bares perderam o seu aspecto de Ágora. Não são mais o espaço público para conviver, conhecer, aprender, duvidar e inovar. Culpo a McDonaldização iniciada pelo Belmonte, mas, na verdade, preciso culpar você. Sim, você. Você que acha mais importante ter um atendimento padronizado e empadinha circulando no salão do que conviver com o caos edificante que os bares de verdade nos oferecem.
Afinal, para ter momentos mágicos, conversas revolucionárias, mudanças de vida e inovações sensacionais é preciso sair da zona de conforto. Coisa que essas franquias de butekos(sic) não oferecem. Muito pelo contrário. Elas estão mais para incubadoras do que para bares.
Desprovidos desse espaço público, muitos de nós se viram para as redes sociais. Nesse ambiente, muitas vezes estéril do bendito soro da verdade, tentamos simular os papos que rolariam nos bares de outrora. Por exemplo, a conversa do vídeo anterior poderia ser reinterpretada dessa maneira:

Concordo, não tem o mesmo glamour, mas funciona. Um pouco.
E os momentos de iluminação surgidos da agressividade mal dirigida dos nossos amigos? A cena clássica do Bar Esperança poderia acontecer assim:




Nessa seca de bons bares, quando nos afastamos uns dos outros, fisica e espiritualmente, talvez as redes sociais por piores que forem, sejam a nossa única saída. Para falarmos; para sermos ouvidos; para chorarmos nossas pitangas; e para buscarmos o ser humano do outro lado. É, aquele. Aquele ser humano que muitas vezes não encontramos no trabalho nem em casa. Aquele ser humano que como nós está no limbo, entre o pessoal e o profissional, doido pra falar e, dadas as condições certas, pronto para nos escutar. Nem que seja pra nos ouvir reclamar do bar em que a gente bate ponto:

Agora que já passou a comoção inicial e as camisetas “Je suis Charlie” já começaram a sair de moda, dá pra começar a sentir qual é a verdadeira opinião da população sobre o fato. Ao invés de uma defesa da liberdade de expressão e, consequentemente, do modelo liberal ocidental que deveria nos pautar, vejo surgir, no meio dos comentários de revolta contra o ato terrorista, o famoso “eles pediram”. Sim, pode prestar atenção. Lá, escondido, entre os “Que absurdo”, “Como isso foi acontecer” e “Coitados”, o povo solta um “junto com os cartunistas morreram vários inocentes” ou o mais comum “também, olha só com quem eles foram mexer”. Continue lendo
Quando fiquei sabendo do atentado à Charlie Hebdo, estranhamente me lembrei de um episódio que me aconteceu há uns dois anos.
O andar onde eu trabalhava em Belo Horizonte ia ser reformado. Fomos forçados a nos abrigar temporariamente num outro andar da empresa e a encaixotar tudo que não fosse de uso diário. Um trabalho chato e cansativo.
No processo de encaixotamento já vislumbrávamos que havia muita coisa a ser jogada fora. Em nome da presteza, o momento 5 S foi deixado para depois. Findas duas semanas de dividir mesas e estações de trabalho com pessoas que não queriam e nem tinham a menor obrigação de realmente nos receber, nosso andar ficou pronto e a mudança de volta foi feita.
Descemos nós, nossos computadores, alguns itens de uso diário e as caixas. Muitas caixas. Além de abrí-las e guardar seus conteúdos nos seus novos esconderijos, precisávamos separar o que seria jogado fora e o que seria doado. Nesse processo uma das maiores atribulações era o que fazer com materiais sigilosos que estavam encadernados com espiral. Eu, infelizmente, rapidamente peguei a manha e separava espirais e papéis com facilidade para que o conteúdo realmente delicado pudesse ser triturado. As espirais, sem uso, eram jogadas numa caixa de papelão para depois se avaliar a possibilidade de reciclagem. Não preciso dizer que o trabalho ficou todo pra mim.
Depois de uma tarde inteira de rasgação de papel e retirada de espirais, sentei na minha estação de trabalho e tive uma epifania. Aquela cena, espirais emboladas numa caixa de papelão, daria uma bela escultura. Continue lendo
Não me ajudou muito na vida ter uma mãe existencialista que estudava filosofia, um pai galhofeiro que não tinha respeito por nenhuma instituição estabelecida e estudar num colégio católico de disciplina rígida. Para dizer a verdade, não só não ajudou como complicou muito.
Enquanto todos os alunos, desde a mais tenra idade, baixavam a cabeça para as ordens e os dogmas, eu os questionava. Até os 10 anos isso era considerado bonitinho. O pior que faziam era passar a mão na minha cabeça e dizer: “Que menino revoltado, hein?”. Desmereciam minhas reclamações e observações e continuavam com a ladainha que, hoje desconfio, nem eles mesmos acreditavam.
Quando fiz 10 anos a situação complicou um pouco. Eu já não era só um menino revoltado. Estava me tornando um pré adolescente questionador e perigoso. Para complicar um pouco a situação, minha educação na época estava sob o comando do melhor exemplo do proselitismo e nepotismo: minha professora de matemática era a filha fanática religiosa e recém formada do diretor do colégio. Continue lendo
“The way does not lead between, but embraces. It is both cheerful play and cold horror.” — Carl Jung
Nas redes sociais e nas ruas, o consenso parece ser que 2014 foi um péssimo ano. Pessoalmente, não gosto de atribuir valor a construções ficcionais. Um ano não tem como ser bom ou ruim. O ano que vem, por exemplo, também não vai ser melhor nem pior. O que pode acontecer é calhar que a maioria dos fatos num dado período de tempo seja mais ou menos agradável. E só. Já o ano em si… ele não tem significado. A não ser aquele que lhe atribuímos.
Por mais que não goste de fazer isso, sou humano. Sim, podem acreditar. Pra piorar leio quadrinhos, ficção científica e fantasia regularmente; jogo RPG; e mantenho relações emocionais com seres ficcionais. Sim, sou um escravo emocional da ficção. Incluindo aquela que chamam de Vida. Exatamente como você. E que atire a primeira pedra quem nunca se emocionou lendo ou vendo um filme que ama. Portanto, nesse momento de retrospectiva forçada, começo a valorar o ano que passou numa tentativa fútil de prever o que ocorrerá em 2015. A minha conclusão? Para mim 2014 não foi bom nem ruim. 2014 foi um ano marcado por grandes momentos de medo e alívio. Continue lendo