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Mr. Rooney’s day of… work

Ontem estava passando Curtindo a Vida Adoidado e quisemos mostrar pra nossa filha. Óbvio que não prendeu a sua atenção. Primeiro porque ela só tem sete anos, e ainda não compartilha da fantasia da fuga da escola como processo de amadurecimento, e segundo porque é um filme onde nada acontece. Nesses tempos onde tudo tem que ser, ou, melhor, parecer alto, inédito, surpreendente e espetacular para competir com algo que se diz mais alto, mais inédito, mais surpreendente e mais espetacular, assistir a um dia em que um garoto resolve matar aula para fazer nada pode parecer bem entediante.

E, é. Ele toca clarinete, brinca no computador, faz um montão de estruturas mecânicas para enganar os pais, fala no telefone à beça, almoça, muda suas notas, passeia de carro e visita vários lugares sem muito propósito. Excetuando os passeios externos, é muito similar à rotina de quem está um ano em aula online. E, sinceramente, tirando o breve conflito familiar específico do Cameron, o único personagem com um arco dramático de verdade, tudo fica basicamente na mesma do início do filme.

Minha filha perdeu o interesse logo no início, mas eu não. Fazia muito tempo que não assistia a esse filme e reencontros cinematográficos sempre me trazem um olhar diferente sobre paisagens comuns. Dessa vez percebi que comecei a prestar mais atenção ao Mr. Rooney e a sentir pena dele.

Enquanto Ferris esfregava seu hedonismo inconsequente na nossa cara, confesso, entendi totalmente a crise e o comportamento do Mr. Rooney. Diretor de uma escola cheia de professores chatos e alunos idiotas, ele leva a uma vida confortável sem um trabalho realmente desafiador, já que boa parte da rotina de trabalho está automatizada. Preso ao marasmo do cotidiano, cercado de jovens, ele sofre pela sua própria juventude perdida. Tem certeza que poderia ter sido mais, porém é a todo momento lembrado pela sua secretária que seu tempo já passou.

Assim, como um Capitão Gancho perseguido pelo Jacaré TicToc, que representa a própria morte, ele se lança à busca do único aluno relapso de uma escola extremamente bem administrada. Ignora os 99% do corpo discente que segue as regras e recebe uma boa, porém maçante, educação. Não está em busca de corrigir um erro, mas da própria juventude.

Não é difícil pensar que Ferris esteja realmente doente em casa enquanto tudo que acontece com ele não passe de uma fantasia de Rooney, que deseja, ele mesmo, não estar na escola. E, se aproveitando da sua autoridade, também escapa dela com uma justificativa totalmente sem sentido.

Rooney, como um Alexandre, o Grande, dos subúrbios de Chicago, se desespera pois olha em sua volta e não tem mais horizontes a conquistar. Sem propósito, caça inimigos imaginários e ataca moinhos de vento, cavando a sua própria ruína.

No final, quando, derrotado, ele descobre que os alunos não estão presos com ele, mas que ele está preso com os alunos, me senti triste por todos nós, que já conseguimos ser Ferris durante dois dias ou duas semanas num verão atípico no início dos anos 90, mas precisamos ser Rooney por décadas. Ferris, como Peter Pan, não envelheceu, mas eu, como Ronney, sim.

Quando vou aprender que preciso deixar o senso crítico e a sensibilidade de lado para assistir a esses clássicos dos anos 80? Perdão, é a falta de férias falando.

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