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Pele de seda, mãos de pedra

Hoje, esbarrei no tweet abaixo. Assistam ao vídeo.

https://twitter.com/BrotiGupta/status/1278034572651851778

Claro que não é novidade. As redes sociais estão coalhadas de reações exageradas para estímulos tímidos. É a paradoxal relação entre ser da geração floco de neve e cuspir fogo. Mas hoje, especialmente, me perguntei por que isso acontece. As pessoas tem motivos para se sentirem ofendidas? A culpa é do emissor que não teve sensibilidade e não contemplou os inúmeros grupos impactados pela sua mensagem? A mídia utilizada favorece ou ensinou a seu público o ódio automático e sem sentido? De onde vem a fagulha que transforma a mais inocente piada num incêndio viral?

Difícil responder, mas tenho minhas suspeitas.

A internet, quando surgiu, era prioritariamente uma ferramenta para comunicação por texto que funcionava por conta de texto. Os programadores escreviam código que comunicava às máquinas como lidar com as interações por texto que os usuários realizavam com as interfaces. Se você pegou a internet pós 2000, provavelmente não teve que lidar com isso. Tudo o que te ofereceram já estava no modelo What you see is what you get. Pra quem é mais antigo a coisa era diferente: boa parte das interações necessitavam de um certo conhecimento de código. Alguém ainda lembra de precisar fazer buscas booleanas?

Então, quando a internet se popularizou, ela juntou dois problemas: era uma ferramenta de texto vendida para uma enorme população que, cá entre nós, não sabe ler de fato, a.k.a. interpretar um texto, e a estrutura de funcionamento das interfaces não estava aparente. Logo você não sabia o contexto e o trânsito das mensagens transmitidas e recebidas o que gerava mal entendidos sucessivos.

Ao invés de tratar isso como um problema, quem estava na luta pra tornar a internet em uma ferramenta comercialmente viável, aproveitando o modelo de vender a sua atenção a anunciantes, considerou esse defeito uma oportunidade e criou uma máquina para se aproveitar das nossas piores emoções e das nossas maiores falhas cognitivas. Começamos a ter valor como rebanho justamente pelo que nos fazia piores.

Quando se possibilitou a interação entre o usuários, ao invés da interação do usuário com a interface, o que chamamos de redes sociais, esse comportamento imediatista instintivo de luta ou fuga, permanentemente estressante e calcado no nosso mal entendimento das mensagens e, principalmente, intenções alheias se tornou a norma. E chegamos ao ponto onde não importa dizer algo ou dizer nada; tudo é ruim.

https://twitter.com/TJPayne3333/status/1278674597693587456

Parece que mais uma vez estão pensando em como desfazer esse imbróglio. Sim, estou acompanhando a discussão sobre as marcas tirando o apoio a essas máquinas de geração de ódio, e entendo o otimismo generalizado, mas acho fogo de palha. Será que realmente interessa a eles mudar esse sistema? Afinal, como na proverbial piada, nós podemos ser malucos mas eles precisam dos ovos.

Espero não ter lhes ofendido com isso.

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