Ensaios

Descompromisso com a verdade?

Tava hoje pensando novamente aqui com os meus botões sobre essa febre de cursos de storytelling para executivos. A minha primeira coisa que me pareceu foi que construiram toda uma disciplina em cima daquele conselho mais velho do que andar pra frente:

– Quando for começar uma apresentação, comece com uma piada.

Como perceberam que, como todo senso comum, isso era uma furada, resolveram mudar o adágio:

– Quando for fazer uma apresentação, utilize uma anedota.

Não daquelas do Bocage. Anedota bem entendida como uma história curta e, pelo menos pretensamente, real.

Além de quebrar o gelo, essa anedota teria um objetivo mais sério: servir de ferramenta para mover emocionalmente o grupo em direção à conclusão oferecida pelo apresentador. Se até Cristo fez isso com suas parábolas, quem pode culpar nossos homens de negócios por querer seguir o seu exemplo?

Mas, depois de pensar bem sobre a questão, percebi que existe um problema escondido nessa disseminação. Storytelling não passa de uma técnica e a sua utilização indiscriminada presume que os contadores de história estarão sempre agindo eticamente e de boa fé. Será que podemos contar com isso? Claro que não. Esse é um dos mais famosos casos que evidenciam a ideologia escondida no tecnicismo tão claro nos ambientes corporativos. Quem tem a técnica seria imune às emoções e não teria propósitos que não os previstos pelo fazer. Tá bom…

Essa mesma discussão pode ser encontrada no conflito entre Sócrates e os Sofistas. Enquanto os sofistas exerciam sua retórica para convencer os outros de seus argumentos, Sócrates buscava usar a maiêutica para chegar à verdade. Se pensarmos dessa forma, fica claro que o compromisso dos processos de comunicação e educação propostos pelas empresas, mas não só por elas, é com a velocidade no convencimento do seu público e não com a busca pela verdade. É a busca do belo (tá, bonitinho) em desconsideração da verdade.

É óbvio que não podemos generalizar, mas se a propagação do Storytelling não pode ser considerada um compromisso com a mentira, por outro lado não garante nada o seu  comprometimento com a verdade. Mentira?

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